31 de maio de 2009

O Foguetão


Tenho vindo a reparar que o assunto na ordem do dia é a exploração espacial… e as razões que levam o povo Português a alhear-se deste assunto e a ficar incompreensivelmente para trás na corrida ao espaço. Nunca enviámos uma nave para o espaço, e “astronauta português” é algo de que nunca se ouviu falar. Porquê? Temos os genes… fomos, e somos, os melhores navegadores do mundo. Partimos à aventura de novos continentes, sem medo, sem saber se eles estavam lá ou não.



Alguns falam do governo. Outros falam de dinheiro. Outros ainda falam da falta dos dois. Por mim, estão todos enganados: nós não somos menos que os EUA ou a Rússia, a França ou a China. A razão pela qual a semente portuguesa ainda não saiu da Terra é unicamente semântica.
Em bom português, como é que se chamam aqueles objectos em forma de charuto que levam gasolina e astronautas e sobem para o espaço? Exactamente. É um “foguetão”. Foguetão. Pensemos um bocadinho nesta palavra, a epítome da tecnologia, algo que viaja pelo espaço sideral, em velocidade terminal, max Q, força g, etc. Chama-se foguetão. “Rocket”, em inglês. Foguetão, como se pode imaginar, deriva de foguete; com uma terminação aumentativa. Um foguete grande. Semanticamente, o que distingue um objecto que custa muito mais que muitas casas, que aguenta temperaturas inimagináveis, que leva pessoas e satélites para o espaço, que envolve dezenas de génios a trabalhar; de um utensílio muitas vezes caseiro, feito com uma cana, com um explosivo na ponta, que ou sobe e faz “pum” ou arranca os dedos de quem o mandou, é o ditongo “ão”. Não duvidem. Com esta atitude, nunca enviaremos nada que ultrapasse as copas de árvores altas.



Mesmo quando, ou se, ultrapassarmos esta triste barreira semântica e finalmente enviarmos um foguetão para o espaço, não nos iludamos: ele não se vai chamar “Challenger”, ou “Apollo”, ou “Endeavour”, como os nomes épicos que uma nave espacial deve ter. Vai chamar-se “Dona Maria”. Vai chamar-se “O Viriato”. Vai chamar-se “Lolita”, ou “O Vingador”, ou mesmo “O Vira Tripas”. Vai ser baptizado com uma garrafa de verde como os Moliceiros ou os Rabelos ou outras embarcações. Terá a sua festaça, com uma chanfana de cabrito na véspera do lançamento. Portugueses irão gravar o seu nome no reactor com uma navalha. Não faltarão chalaças sobre o paralelo entre o foguetão e os foguetes que serão lançados: “Vamos lá a ver se não acontece ao grande o que acontece a estes, ah ah ah!”.
No dia seguinte, os astronautas levarão taparuéres com sardinhas de escabeche, bacalhau à Braz e rissóis de carne. Finalmente, se a garrafa de Faisão, ao partir-se na fuselagem, não parta também o vedante do depósito de combustível, o foguetão não explodirá em pleno vôo e largará a atmosfera terrestre, penetrando finalmente o cosmos.
Lá em cima, mais tarde, o astronauta puxará de um pastel de bacalhau e dirigir-se-á para a escotilha. Vai procurar Portugal lá em baixo. “Como é possível”, dirá ele quando o encontrar. “Somos mesmo pequeninos”.

"Porra, está frio aqui fora..."




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