1 de abril de 2009

Echpanhola

Vive no meu quarto um palhaço, muito quieto
Só se mexe quando não vê ninguém por perto.
Não dorme, não come, não fala, não anda.
Fica apenas parado, juntinho da varanda.


Trabalha no mesmo edifício que eu uma espanhola fanhosa que reúne duas características muito peculiares: é espanhola, e é fanhosa. Ao mais alto grau. Não vou descrevê-la ao pormenor por medo do libelo; vou apenas adiantar que é bastante forte, e não tem uma linha de cabelo certa: tem sim um degradé hirsuto desde o cabelo, muito preto, até à frente da cara, composto por aquele tipo de pêlo que não é bem cabelo mas também não é barba.

Conheci-a quando ela me explicou como funcionava o seu espectrofotómetro (tende em conta que se trata de uma espanhola fanhosa). O meu fascínio por ela, desde então, não parava de aumentar. Ao ponto de, quando nos encontrávamos cá fora e ela estava a falar com alguém, tentava aproximar-me, não para ouvir a conversa, mas sim para a ouvir falar. Inconscientemente, as minhas glândulas salivares apertavam-se, como quando se dá aquela primeira dentada numa maçã verde. Ouço-a dizer “si” com deleite (gostava que houvesse uma consoante para o som que ela emite, o mais próximo seria “chchchciiiii”, mas com perdigotos): Ouve-se um ciciar, ou um borbulhar, parece que tem um bule de chá a ferver dentro da boca, ou que tem a boca cheia de peta-zetas. É um prazer culpado, bem sei, como aquele de estalar bolinhas do plástico de embrulho, um pau de giz a riscar um quadro ou o esfarelar de esferovite. Costuma também, e para o meu agrado, andar com dois pares de óculos: uns escuros e uns “de ver”. Os que usa à frente dos olhos depende se está fora ou dentro do edifício. Os que não usa estão colocados em cima da cabeça.

Por alguma razão, nunca mais consegui ter hipótese de a ouvir. Quando eu apareço ela cala-se, mesmo quando está a falar com outras pessoas.
Não sei se tem alguma coisa a ver, mas ainda não fiz nenhum amigo espanhol.

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